sábado, 22 de outubro de 2016

Jongo, o “pai” do samba, ganha documentário

Um casal rodopia no chão de terra batida, acompanhado ao som de tambores. Os corpos se movem pra frente e pra trás em sincronia. A cadência dos passos ligeiros é marcada pelo bater de palmas da roda composta por mulheres, homens, velhos e crianças. “Sou negro que fugiu do cativeiro/ Deixei meus grilhões lá na senzala/ Sou negro que lutou a vida inteira/ Sou livre, eu só luto capoeira”, cantam em uníssono.

Observar a roda de jongo praticada pelos descendentes do Quilombo São José da Serra é como vivenciar a história. É a mais antiga comunidade quilombola do Rio de Janeiro, formada em 1850. Também conhecido como caxambu, o jongo surgiu como um ato de resistência dos negros escravizados nas lavouras de café do atual município de Valença, situada no Vale do Paraíba fluminense.

“Os remanescente do Quilombo São José acreditam que o jongo nasceu da interação entre os índios e os pretos bantos, vindos do Congo e da Angola. Quando os fugitivos se encontravam nas matas, eles celebravam ao som de tambores”, conta Márcio Brito Neto, diretor do documentário Serra do Caxambu. O curta de 15 minutos, que marca a estreia do estudante de cinema, será exibido durante o Festival Mimo, no dia 12 de novembro, no Cine Odeon, no Rio de Janeiro.

Considerado o ancestral do samba, o jongo não se resume a apenas a um ritmo. A manifestação tem uma forte influência religiosa. Não são raros os pontos louvando santos católicos e divindades afro-brasileiras. Antes de cada roda, o tambor recebe a benção das rezadeiras da comunidade, na tentativa de evitar energias negativas e brigas.

Mas no final da conta, é a festa que importa. No calendário do Quilombo São José, a maior delas é celebrada no dia 13 de maio, dia de Preto Velho, quando a pacata vila de casas de pau a pique recebe até três mil visitantes.  “O jongo é um divertimento, é uma distração que a gente tem. Aqui não tem um cinema, não tem nada. Qualquer coisa a gente se ajunta, faz um barulho e se diverte muito”, define Manoel Seabra, o “Tio Mané”, em depoimento durante o filme.

O jongueiro de 95 anos é um dos principais responsáveis por manter a tradição do jongo. Na sua infância, as regras do ritual só permitiam a presença de adultos no terreiro. Hoje em dia, a brincadeira é incorporada cada vez mais cedo na vida das crianças, no intuito de preservá-la para as futuras gerações. Apesar de o caxambu ter sido proclamado patrimônio cultural brasileiro em 2005 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a comunidade continua sem apoio.

“Com a expansão de grandes latifundiários, os moradores não têm muitos meios para o sustento. A maioria da população local é composta por mulheres, porque os homens e os mais jovens vão para as favelas dos grandes centros à procura de melhores condições. Ainda existe uma cultura viva, pulsante naquele lugar. Só que sem uma real consciência da sociedade, perderemos uma das manifestações artísticas populares mais significativas neste país”, desabafa Márcio.

Serviço:
Estreia do documentário Serra do Caxambu (15 min, RJ, 2016), do diretor Márcio Brito Neto
Quando: 12/11/2016, às 18 horas
 Onde: Cine Odeon, Rio de Janeiro – RJ
 Mais informações no site.

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