sábado, 13 de agosto de 2016

O terror no cinema brasileiro

Quando se fala sobre “Filmes de terror nacionais”, provavelmente o que vem primeiro à cabeça de muitos brasileiros é o nome de Zé do Caixão, personagem do cineasta José Mojica Marins, e toda sua franquia de filmes. Quem acompanha a trajetória do cinema sabe que as produções nacionais vão muitos além de um único nome. Só em 2016, foram lançados nas telonas longas que mergulham ou passeiam na temática. É o caso de O Caseiro, de Julio Santi, Sinfonia da Necrópole, de Juliana Rojas e O Diabo Mora Aqui. Esse último conta a história de quatro jovens que vão passar o final de semana em uma casa de campo e são arrastados para o meio de uma guerra entre forças antigas, que incluem lendas e o folclore brasileiro.

O filme é a primeira adaptação da Urbania, obra transmídia criada pelo produtor M.M. Izidoro, que se baseia nas lendas urbanas brasileiras e busca uni-las para que elas possam continuar vivas e se mesclem em outros formatos como livros, filmes, séries, entre outros. A obra é independente e não contou com financiamento de leis de incentivo, mas foi custeado por meio de R$250 mil arrecadados por meio de campanha de crowdfunding. Questionado sobre como é a recepção do público brasileiro com filmes de terror, Izidoro diz que “esses títulos e realizadores estão mostrando para o público que o cinema de gênero brasileiro pode ser comparado com o cinema de qualquer lugar do mundo e o público está recebendo a gente de braços abertos”.

O Diabo Mora Aqui foi muito bem recebido por festivais internacionais como o Festival Internacional de Cinema Fantástico de Catalunha, no México, e FilmQuest, nos Estados Unidos, onde recebeu o prêmio de melhor filme estrangeiro. “Fora do país o pessoal é sedento pelo cinema brasileiro. Levamos O Diabo Mora Aqui para alguns países e vimos que tanto os curadores, quanto o público, tinham muito interesse nos nossos filmes e os recebiam de braços abertos”, comenta o produtor.

Abaixo, você confere um bate-papo que o Tela Brasil teve como M.M.Izidoro.

Como foi a criação para o roteiro de “O diabo mora aqui”?
“O Diabo Mora Aqui” é a introdução de um projeto maior chamado “Urbania”. Nesse projeto, eu misturei história do Brasil com lendas urbanas e personagens do nosso folclore para criar um mundo novo onde tudo isso está interligado de uma maneira que ninguém viu. Para o filme, juntei toda essa mistura com alguns temas importantes para mim, por exemplo, a escravidão, a cultura afro descendente, o papel da mulher e alguns outros. Daqui para frente, vamos explorar as personagens do filme em diversas mídias.

 Você se inspirou em outras obras audiovisuais para criar esse filme?
Mais do que obras específicas, nos inspiramos em movimentos cinematográficos e nas obras de alguns cineastas e autores. Podemos citar alguns como Joaquim Pedro de Andrade, Sam Raimi, Bernard Rose, Jô Soares e John Landis.

 Como surgiu a ideia e como foi o processo de arrecadar fundos para o longa?
Esse filme demorou 10 anos para ser produzido. Grande causa disso foi o medo que as pessoas tinham de se associar a uma obra de cinema de gênero brasileira, afinal nenhuma marca tem como valores assassinatos ou monstros aterrorizantes. Assim, vi que tinha de encontrar outro caminho. Como já tive algumas startups, resolvi trazer esse conceito para o cinema, na qual algumas pessoas da equipe seriam sócias comerciais do projeto e traríamos investidores para colocar o dinheiro que a gente precisava para pagar o resto. Estive nos mercados de cinema do mundo como CannesBerlinale e o American Film Market, e com as informações que eu aprendi nesses lugares, eu montei um plano de negócios e apresentei para alguns investidores do mercado financeiro que abraçaram o projeto. Além disso, também conseguimos vender uma cota de product placement para umamarca de cerveja.   

 Quais as etapas mais desafiadoras de se fazer cinema no Brasil?
Fazer cinema é desafiador em qualquer lugar. É como escalar uma montanha, mas quando você chega no topo, você descobre que tem outra lá em cima. Assim, todas as etapas tiveram seu nível de dificuldade. Primeiro, foi uma odisseia para conseguir os recursos e a equipe para fazer o filme. Na pré-produção, foi difícil escrever uma história interessante e que caberia nos nossos recursos. Na produção, tínhamos de manter uma equipe de 30 pessoas vivas e alimentadas no interior de São Paulo. Na pós-produção, foi bem difícil achar o ritmo certo do filme e como costurar todas as histórias diferentes. E depois ainda vem a comercialização, que você tem de convencer as pessoas a comprá-lo. O bom para o cinema é que todo mundo que faz é muito apaixonado por ele e essa paixão nos move.

 Na sua visão, como é a recepção do público brasileiro com filmes nacionais de terror?
Acho que estamos em um ponto de transição bem legal para isso. Até a minha geração, os filmes de terror nacionais tinham um estigma de serem trashs e ruins. O que eu não concordo 100%. Hoje, o nosso filme faz parte de uma geração de filmes bem interessantes que traz outros títulos como “O Caseiro”, “Percepção do Medo”, “Condado Macabro”, “Fabulas Negras”, entre outros. Esses títulos e realizadores estão mostrando para o público que o cinema de gênero brasileiro pode ser comparado com o cinema de qualquer lugar do mundo e o público está recebendo a gente de braços abertos.

 Você acha que os filmes de terror nacionais deveriam ter mais espaço nas salas de cinema?
Não só os filmes de terror deveriam, mas todos os filmes de gênero. Cadê os filmes brasileiros de super heróis, de vampiro, de bruxa, de macumba, de luta, de dinossauro? Sempre corremos para assistir os filmes gringos com essas temáticas. Já com os nacionais, além de ser mais difícil de fazer também é difícil ter público. Mas aos poucos isso está mudando e acho que em pouco tempo o mercado vai entender e vamos conquistar ainda mais espaço, não só no cinema como em várias outras mídias como TV, VOD e SVOD.

 Como os filmes de terror brasileiros são recebidos nos festivais internacionais?
Fora do país o pessoal é sedento pelo cinema brasileiro. Levamos “O Diabo Mora Aqui” para alguns países e vimos que o tanto os curadores, quanto o público, tinham muito interesse nos nossos filmes e os recebiam de braços abertos.

 Quais são os próximos passos de “O diabo Mora Aqui”?
O filme será lançado em VOD e na TV paga. Já o vendemos para alguns territórios internacionais e, sabemos que até o fim do ano ele será lançado em home vídeo, VOD na Europa e na América do Norte. Depois disso, vamos tirar umas boas férias e descobrir como continuaremos a contar essa história. Se é em cinema, em livro, em série para tv.

 Você está trabalhando em outros projetos?
Sim. Estou finalizando meu novo longa-metragem “Amaré”. É um filme musical que estou fazendo em parceria com a Apple e o iTunes e deve ser lançado no começo do ano que vem. Estamos trabalhando em uma peça de teatro também que pretendemos estrear no ano que vem. Então mesmo com a correria do “O Diabo Mora Aqui”, estamos a todo vapor tentando explorar novos mercados e maneiras de contar histórias.

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