Esqueceram de Mim (Home Alone – 1990)
Quando se é criança, a véspera do Natal pode ser o dia mais épico em um ano, uma alegria que compensa todos os problemas vividos na escola e em casa. Acho tolice quando os pais negam aos filhos pequenos essa magia inofensiva, uma fantasia que pode inspirar a criança a vencer seus obstáculos no chato mundo real. A programação da televisão ajudava muito nessa construção de clima, elemento que ultimamente vem perdendo força, já que não há mais responsabilidade alguma nos responsáveis pelas emissoras, com o entretenimento infantil sendo cada vez mais desvalorizado. A criança dos anos oitenta ligava a televisão, desde o início da manhã, para se encantar com os filmes natalinos. E, dentre todos os que fizeram parte das minhas lembranças mais ternas, com menção honrosa para “Férias Frustradas de Natal”, há um lugar especial para essa pérola do diretor Chris Columbus, presença marcante na “Sessão da Tarde” global. E ter a presença de John Candy, um dos meus atores favoritos na época, ajudava bastante.
Até hoje, quando penso em Natal, o bonito tema composto por John Williams invade minha mente e ajuda a adoçar a nostalgia. Não foi surpresa constatar, alguns anos depois, que o roteiro era do mestre John Hughes, o poeta da juventude, o homem que melhor soube compreender os anseios de toda uma geração. Por trás de todo o alegórico pastelão exagerado necessário na trama, o pequeno Kevin, vivido por Macaulay Culkin, representa a inocência infantil lutando para sobreviver às investidas do cinismo adulto, tolo e atrapalhado, como representado pelos bandidos, vividos por Joe Pesci e Daniel Stern, que tentam de todas as formas invadir sua casa. Ele é esquecido por seus familiares, encontrando improvável companhia na figura de um idoso vizinho solitário, vítima de falsos rumores sobre uma mancha criminosa em seu passado, que também foi esquecido por sua família. O garoto, com essa amizade, acaba ensinando que, ao contrário dos adultos em sua vida e na sociedade, ele consegue vencer o preconceito, o medo. Grande parte do público lembra apenas das armadilhas no terceiro ato, mas o coração do roteiro está nessa relação.
Ao conseguir lidar sozinho com as responsabilidades de casa, a criança mostra que, em essência, já possui o básico para a vida, as qualidades mais importantes, que, invariavelmente irão ser corrompidas no ato de envelhecer, o despertar da ganância, a luta por mais diplomas, melhores empregos, maiores mansões, enquanto os valores reais são esquecidos. A divertida aventura exploratória da infância se torna uma gélida busca pela aceitação do outro.
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