Escritor, professor, poeta, diretor de cinema, político – sempre político -, o italiano Pier Paolo Pasolini (1922-1975) nunca teve medo de ser polêmico. E o filme Pasolini, dirigido por Abel Ferrara (outra figura controvertida, não poderia ser diferente), traz como mantra para sua narrativa o direito de escandalizar e o prazer de se sentir escandalizado. E a reboque o falso moralismo por trás de quem o critica vem junto. Ou seja, Pasolini não é somente uma cinebiografia, mas um libelo a favor da liberdade de expressão.
Ambientado no que seria o trágico último dia da vida do diretor, Pasolini se estrutura tal como uma amalgama onírica sobre o perfil praticamente lendário do personagem, interpretado por um Willem Dafoeimpressionantemente semelhante. Ferrara funde sonho e realidade. É lírico enquanto humaniza o personagem. Dispõe fragmentos de um roteiro nunca filmado por Pasolini para contar a história de um sujeito genial, fervilhante de ideias, disposto sempre a desafiar. Logo Pasolini assume condição de exercício metalinguístico, mas isso não é o mais importante.
E se para Pasolini sexo e politica caminhavam lado a lado, Ferrara igualmente não teme a lascívia. A sexualidade do retratado é uma extensão natural de seus pensamentos e atitudes. O Pasolini de Abel Ferraraé alguém que expressa sua sexualidade como forma de resistência a opressão violenta do seu cotidiano. Não à toa a narrativa é pontuada com impressões sobre crimes de ódio que aconteceram na mesma época da sua morte. A própria resolução oficial do assassinato do diretor levanta dúvidas até hoje.
Mas o foco de Pasolini enquanto filme não é mesmo o registro histórico. Ferrara tem muito mais interesse pelo viés politico do personagem-título e de como isso influenciava a sua expressão artística. De como Pasolini maquinava histórias onde o sexo assumia a posição de vetor da mudança – Accatone – Desajuste Social (1961) – ou atrofiador de ideologias – Salô ou 120 Dias de Sodoma (1975). De como prazer e a ausência do mesmo caminham sobre a fina linha da insanidade. De como uma artista como Pier Paolo Pasolini faz falta nos conservadores tempos em que vivemos.
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