quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Dois Caras Legais

129045.jpg-r_1280_720-f_jpg-q_x-xxyxx

A paródia de filme de gênero é um fetiche em Hollywood. O da vez é o policial noir com Dois Caras Legais, de Shane Black. O diretor já tinha feito algo semelhante no seu filme de estreia, Beijos e Tiros (2005). Se na primeira investida atualizava os mais diversos clichês e situações para os dias de hoje, o recente é mais ambicioso e volta aos anos setenta de filmes incríveis como Um Perigoso Adeus (1973). E Dois Caras Legais têm um pouco do citado filme de Robert Altman, principalmente o jeito desleixado de um de seus protagonistas, mas nem de longe atinge igual excelência.

Dois Caras Legais começa com a morte de uma atriz de filmes pornográficos, Misty Mountains (Murielle Telio). A cena de abertura muitas vezes dá o tom de todo o filme. E a banalidade com que o carro de Misty atravessa – literalmente – uma casa e se despedaça num penhasco leva logo a duvidar da qualidade do que estamos prestes a ver… Uma tia desconfia que a sobrinha não morreu e contrata o detetive particular March (Ryan Gosling). Não demora até o seu caminho cruzar com o do valentão Healy (Russell Crowe). E o caminho dos dois cruzarem com o da misteriosa Amelia (Margaret Qualley) e a secretária de justiça Judith (Kim Basinger).

Nesse meio tempo Dois Caras Legais tira sarro – de forma até certo ponto inspirada – da ideologia hippie. O questionamento “-se estão de mascaras como podem estar mortos?” proferido pelo Healy de Crowe durante uma manifestação pacifista é uma das melhores coisas a ser oferecida por um filme que vai se revelando cada vez mais irregular durante sua projeção. E tal irregularidade muitas vezes se deve a momentos constrangedores como quando o March de Gosling rola por um morro numa gag física vergonhosa. A sequência poderia estar em algum dos piores filmes do Adam Sandler

No film noir esse tipo de acontecimento – a morte ou sumiço de uma bela mulher – costuma ser um convite para passear num microcosmo marginal recheado de párias e mulheres fatais. Mas o submundo de Dois Caras Legais é legal demais, com perdão do trocadilho barato. Não envolve. É asséptico. O sexo, drogas e rock n´ roll são tratados como num comercial de margarina. Até a típica secretária é substituída pela filha de treze anos de March, a simpática Holly (Angourie Rice). O filme tem jeitão de “para toda a família” e talvez a intenção seja essa mesmo: de fingir desconstruir um gênero tipicamente para adultos enquanto aumenta seu lastro nas bilheterias.

Mas nessa de “desconstrução legalzona”Dois Caras Legais fica parecendo ora meio bobo e ora meio moralista demais. A personagem da pequena Holly é uma espécie de termômetro das ações, pronta a apontar quando alguém passa dos limites. A piada na primeira vez surge inspirada, mas se desgasta pela repetição. E não é difícil constatar que o roteiro carece mesmo de compreender o gênero, suas coincidências e trazer dessa compreensão boas piadas dos lugares comuns tão caros aos entusiastas. Ao colocar seu pano de fundo setentista de lado para focar na relação cômica entre March e Healy, e seus desdobramentos, fica parecendo que localizar a trama nos anos setenta é apenas mais um dos tantos exercícios de estilo vazios propostos pelo filme.

Nota do CD:
2.5 out of 5 stars


Sinopse:Na Los Angeles dos anos 1970, a filha de uma funcionária do Departamento de Justiça dos Estados Unidos é sequestrada e ela decide contratar Jackson Healy (Russell Crowe), brutamontes violento e ex-alcoólatra, para investigar o caso. O trabalho revela-se mais complicado do que o esperado e ele decide contar com a ajuda a um medroso e atrapalhado detetive particular (Ryan Gosling).

Ficha Técnica:
Gênero: Comédia
Direção: Shane Black
Roteiro: Anthony Bagarozzi, Shane Black
Elenco: Beau Knapp, Jack Kilmer, Keith David, Kim Basinger, Margaret Qualley, Matt Bomer, Rachele Brooke Smith, Russell Crowe, Ryan Gosling, Sala Baker, Sandra Rosko, Ty Simpkins, Yaya DaCosta, Yvonne Zima
Produção: Joel Silver
Fotografia: Philippe Rousselot
Montador: Joel Negron
Trilha Sonora: David Buckley, John Ottman
Duração: 116 min.
Ano: 2016
País: Estados Unidos / Reino Unido
Cor: Colorido
Estreia: 21/07/2016 (Brasil)
Distribuidora: Diamond Films
Estúdio: Misty Mountains / Silver Pictures / Waypoint Entertainment
Classificação: 14 anos

Nenhum comentário: