Imagine receber a notícia da sua própria morte. Em 2011, o cronista e escritor João Paulo Cuenca viveu essa experiência: um cadáver encontrado num prédio da Lapa, no Rio de Janeiro, foi identificado pela polícia com a sua certidão de nascimento. O fato peculiar tornou-se o mote para que ele escrevesse, simultaneamente, o livro “Descobri que estava morto” e o documentário-ficção “A Morte de J.P. Cuenca”.
Na época, o escritor morava em um prédio localizado em cima de um restaurante barulhento que incomodava muito os moradores do imóvel. Cansado desse incômodo, certa noite Cuenca foi à janela, berrou um palavrão e lançou um saco de lixo com correspondências. Com os dados do escritor em mãos, claro, os insultados prestaram queixa na polícia. João foi convocado a comparecer à delegacia e, ao chegar ao local, descobriu que havia morrido no dia 14 de julho de 2008. Seu corpo havia sido reconhecido por uma mulher identificada como Cristiane Paixão Ribeiro. Esse inusitado episódio virou o primeiro longa-metragem do cronista e escritor, que está em cartaz em várias salas de cinema do país.
MISTÉRIO
O prédio em que o escritor foi “encontrado morto”, passou por uma reforma e é o centro da investigação desse caso. Para tentar esclarecer esse mistério, Cuenca vai até o local e conversa com vizinhos do morto, moradores de ocupações próximas, além de procurar um ex-delegado de polícia, detetives e outros envolvidos nessa história.
Ao misturar realidade e ficção, A Morte de J.P. Cuenca também questiona o Rio de Janeiro, um canteiro de obras em anos pré-olímpicos. Por email, o cronista e escritor conversou com o Tela Brasil sobre o seu primeiro longa-metragem:
Como foi o processo de criação do “A Morte de J.P.Cuenca”? Você escreveu o livro e o roteiro do filme simultaneamente?
Desenvolvi, filmei, escrevi e montei tudo ao mesmo tempo. O resultado final são obras muito diferentes – quase complementares – mas o processo de criação foi simultâneo. Não há diálogo escrito no roteiro do longa, é um documentário que joga com a linguagem do cinema de ficção o que produz tensão estética, mas o texto é o que está na boca dos seus não-atores em cenas não ensaiadas. O filme não tem voice-over, não tem um “narrador” que o explique. O livro é, em muitos casos, justamente o contrário. O domínio do romancista é total.
Qual foi a sensação ao descobrir que você “havia morrido”?
Escrevi esse livro e filmei o longa para tentar responder essa pergunta.
Além da sua própria experiência, se inspirou em outras obras
para escrever o “A Morte de J.P.Cuenca”?
para escrever o “A Morte de J.P.Cuenca”?
Pensei muito no Inquilino do (Roman) Polanski, em alguns planos do (Michelangelo) Antonioni, no trabalho do Dib Lutfi, no Lira do Delírio, em Iracema, uma transa amazônica, no (Rogério) Sganzerla, em fazer um filme noir com luz estourada, sob poeira de obra – e na Lapa. E em dezenas de outros filmes, livros e quadros. Há um plano central no longa, que é a capa do livro “Descobri que estava morto” que é diretamente inspirado no quadro “Viajante Sobre o Mar de Névoa”, um óleo do alemão Caspar David Friedrich, de 1818.
Teremos uma continuação da história no papel e nas salas de cinema?
A continuação da história, creio eu, será na vida real. Tanto o filme quanto o livro são peças de um quebra-cabeças que ainda não foi resolvido. O inquérito policial segue em aberto.
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