segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

"O Gato de Nove Caudas" e "Terror na Ópera", de Dario Argento



O Gato de Nove Caudas (Il Gatto a Nove Code – 1971)

Um repórter e um jornalista cego aposentado tentam resolver uma série de assassinatos e acabam se tornando alvos do assassino. 


Esse é o meu favorito da Trilogia dos Animais, peças fundamentais no giallo, com o diretor demonstrando tremenda evolução em seu segundo trabalho, uma maior segurança em seu estilo, marcado pela utilização generosa da câmera subjetiva, representando o ponto de vista do assassino, transformando ele em um caçador urbano que persegue suas vítimas de forma quase animalesca, referência intensificada no uso constante de planos de detalhe no olho do assassino. Após “O Pássaro das Plumas de Cristal”, Argento ousa quebrar alguns paradigmas estabelecidos por ele mesmo no anterior, minimizando a violência, potencializando o impacto das cenas com truques de edição, seguindo os ensinamentos do mestre Alfred Hitchcock. Destaco aqui a fantástica sequência do ataque na estação ferroviária, o ponto alto do filme, que contém uma mordaz crítica ao culto das celebridades, já que toda a comoção pública com a tragédia é interrompida e esquecida, minutos depois, quando uma atriz famosa desce do trem. A parceria entre o jornalista cego (Karl Malden) e o repórter (James Franciscus), além de funcionar pela ótima química dos atores, é favorecida também pela presença da pequena e adorável neta do jornalista, tão inteligente quanto os dois, inserindo doçura e um toque de conto de fadas sombrio ao produto final.


Terror na Ópera (Opera – 1987)

Uma jovem soprano é perseguida por um assassino doentio durante a montagem da ópera “Macbeth” em Milão.


Argento cria aqui sua última obra-prima, uma declaração muito pessoal de amor à arte, ao inserir elementos de terror nesse giallo com toques de “O Fantasma da Ópera”, de Gaston Leroux, um tema muito querido pelo diretor. É fascinante perceber a conexão entre as árias utilizadas na trilha e as sequências emolduradas por elas, algo que eleva exponencialmente a qualidade da obra e, especialmente para os amantes de ópera, grupo em que me incluo, a sua eficiência em revisões. Ao usar a oração de paz, a ária mais famosa de “Norma”, de Bellini, como pano de fundo para a cena em que a jovem, escondida em seu apartamento, tenta sobreviver ao ataque do assassino, o roteiro nos coloca na pele do povo que, confrontando a paz desejada pela personagem na ópera, busca aos gritos os deuses da guerra. O público do giallo quer ser surpreendido com cenas de assassinato mais criativas, ele quer ver sangue. É uma metáfora muito sutil, uma demonstração de inteligência e, acima de tudo, sensibilidade. E, reforçando essas qualidades, nos momentos mais violentos, somos presenteados com um heavy metal, som totalmente alienígena no contexto já estabelecido, provocando um despertar sensorial. Vale destacar também a excelente sequência em que Argento utiliza sua usual câmera subjetiva em um complexo sistema de gruas e guindastes, para nos colocar no lugar dos corvos em voos rasantes dentro do teatro.





* Os filmes estão sendo lançados em DVD pela distribuidora Versátil na caixa “A Arte de Dario Argento”, com exclusividade pela Livraria Cultura, contendo também, além de ótimos extras, os filmes: “O Pássaro das Plumas de Cristal” e “Quatro Moscas Sobre Veludo Cinza”.

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