Errado Pra Cachorro (Who’s Minding the Store? – 1963)
Considero exagerada a influência de Frank Tashlin nos voos solo de Jerry Lewis, não vejo o segundo como um pupilo, mas, sim, como um professor generoso. Basta rever as obras de ambos os diretores, para constatar que muitas comédias do primeiro, especialmente aquelas fora da parceria com Martin/Lewis, não resistiram ao teste do tempo, enquanto que os filmes dirigidos por Lewis seguem com a mesma força. Tashlin iniciou profissionalmente na área da animação infantil, um traço leve que ele carregou para seus projetos adultos. Os críticos franceses adoravam filmes como “Ou Vai ou Racha”, “O Rei dos Mágicos” e “Artistas e Modelos”, que eu considero medianamente suportáveis, prejudicados pela união da leveza exagerada dele com a tendência de Lewis para o sentimentalismo.
Mas, dentre todos os seus filmes, o meu favorito é “Errado Pra Cachorro”. É um dos poucos em que a trama central não envolve um protagonista interessado em uma escalada social. Muito pelo contrário, o Norman Phiffier, vivido por Lewis, faz questão de merecer cada centavo recebido nos trabalhos mais inusitados, ficando revoltado ao descobrir que sua namorada, vivida pela bela Jill St. John, a ascensorista da loja de departamentos, na realidade, é a filha rica do dono. Ele é pobre e se sente honrado com sua condição, enquanto que o núcleo da família da namorada é mostrado sempre em tons caricaturais, pessoas que se mostram pouco confortáveis em sua grandiosa mansão. A câmera, em ângulos que enfatizam a antinaturalidade daquele elefante branco, como na sequência inicial, passeia lentamente pelo local, que, com ajuda de espelhos, acaba tomando dimensões ainda maiores. A forma encontrada por Tashlin para criticar esse mundo é inserir um elemento de caos, a anarquia representada por Lewis, o atrapalhado que, sem intenção, acaba destruindo toda aquela falsidade. A bagunça episódica remete aos trabalhos de Jacques Tati, que, tenho certeza, aprendeu muito com o norte-americano, basta comparar tematicamente o seu “Playtime”, de 1966, com o pouco citado: “Em Busca de Um Homem”, dirigido por Tashlin em 1957.
As soluções para as gags visuais são, como em todos os trabalhos do diretor, puro desenho animado, pedindo ao público total suspensão de descrença. A cena mais lembrada é, tenho certeza, uma criação de Lewis, o concerto na imaginária máquina de escrever, um conceito brilhantemente simples, executado com maestria. Gosto muito também da minimalista reação dele ao encarar as pinturas das rabugentas esposas da família Tuttle. O roteiro inventa vários momentos complexos e movimentados, porém, a genialidade está mesmo nas cenas menores, como uma ambientada dentro do elevador, com Norman, sua namorada e o pai dela. Não me canso de rever essa comédia que fez parte da minha infância.
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