quarta-feira, 21 de setembro de 2016

O road movie jovem “Lua em Sagitário” fala sobre questão agrária e tem trilha sonora surpreendente


Está em cartaz no cinema Lua em Sagitário, primeiro longa de ficção da diretora Marcia Paraiso. O filme é uma espécie de road movie voltado para o público jovem, com paisagens abundantes do interior de Santa Catarina, que trata da disputa pela terra e o preconceito como elementos resultantes da intensa luta de classes que atravessa a história do Brasil. Outro preconceito abordado pela cineasta é o contra jovens que não vivem nos grandes centros urbanos. É nesse contexto que a trama se desenvolve, tendo como eixo as rotinas de dois jovens que passam longe dos padrões veiculados pela mídia de massas.

Ana é uma adolescente de 17 anos que vive em Princesa, uma cidade de cinco mil habitantes no interior de Santa Catarina. Filha única de família tradicional, ela não se identifica com os hábitos da sociedade local, o que a faz ter poucos amigos e sonhar com experiências em terras distantes, como a ida ao Psicodália, festival de rock realizado no mesmo estado. O outro protagonista é Murilo, um jovem nascido e formado no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que mora num assentamento em Dionísio Cerqueira, divisa com a Argentina.

Lua em Sagitário conta com participações especiais de Elke Maravilha e do roqueiro Sergei, além de uma rica trilha sonora, que guia boa parte do enredo. Em 98 minutos, o longa presenteia o público com canções como  Lucifernandes (Boogarins), Amor Marginal (Jhonny Hooker), Só sei dançar com você (Tulipa Ruiz) e Chica Chuteira (El Mató a um Policial Motorizado), entre outras.

Por email, a diretora Marcia Paraiso contou ao Tela Brasil sobre o processo de produção e curiosidades do longa. Veja abaixo:

Como surgiu a ideia de criar “Lua em Sagitário”?

Foi uma ideia construída por anos. A vontade de levar pra ficção a questão da reforma agrária e do movimento social organizado, numa linguagem que dialogasse com o público jovem, era um sentimento que pulsava desde o final dos anos 90. Mas o argumento em si, desenvolvido em roteiro em parceria com o Will Martins, veio depois, em 2009. Mas foi só em 2013, quando ganhamos o prêmio Ibermedia (para projetos iberoamericanos), que o sonho começou a se concretizar. E as filmagens só se viabilizaram no final de 2014, início de 2015. Foi um longo percurso, natural para quem faz cinema independente no Brasil.

No longa, a presença da música é muito forte. Como foi feita essa curadoria? Por que essas músicas foram escolhidas?

São as músicas que movem a personagem da Ana, a protagonista. É a partir da música que ela encontra um ponto de fuga em uma rotina que se repete, numa cidade com cinco mil habitantes, sem opções de lazer, sem cinema, com uma internet precária. A gente quis romper com o preconceito que se tem com o jovem que está no interior. Muita gente na cidade ainda vê a zona rural como um atraso, um local onde os jovens são menos conectados, menos engajados, mais limitados. Existem jovens com todos os gostos, com todas as vontades, em todos os lugares. A curadoria foi bem colaborativa, tendo à frente a Ju Baratieri, que tem um amplo conhecimento da cena independente de rock/indie, mas também com a colaboração da minha filha, Joana Paraiso, e com a colaboração essencial do ator Jean Pierre Noher, que interpreta LP no filme, que me apresentou a um rock argentino que eu desconhecia.

Serguei e Elke Maravilha contracenaram no filme. Como foi feito o convite e como eles reagiram?

Eu escrevi as cenas para eles, queria homenageá-los. Há uma geração que desconhece Elke e Serguei e, para mim, eles representam pessoas de espírito livre, gente rara, importante de se fazer conhecer em tempos de ódio e tanto preconceito. Queria homenageá-los. Eles ficaram super à vontade e nos divertimos muito!

 Você se inspirou e teve influência de alguma obra ou trabalho de algum artista?

Gosto muito dos filmes para jovens – como os nacionais Houve uma vez dois verões, de Jorge Furtado, As melhores coisas do mundo, de Laís Bodanzky, e os gringos Juno, de Jaison Reitman, e A pequena miss Sunshine, da Valerie Faris. Eu me considero um emaranhado de influências. Com certeza tem um pouco desses filmes no Lua de Sagitário, mas tem também várias outras fontes nas quais bebi na minha formação, ao longo da minha trajetória. É muita coisa, desde documentários, até o humor de Woody Allen e Monty Python.

Quais foram os maiores desafios no processo de produção e gravação do “Lua em Sagitário”?

Para mim, que tenho uma formação como documentarista, foi trabalhar com uma equipe grande (22 pessoas) – pequena para um filme de ficção – dirigir o elenco e transformar os espaços, como “a caverna”, nos ambientes imaginados no roteiro. Na real, fazer ficção, pra mim, foi um grande desafio.

Qual a dica que você dá para realizadores em início de carreira?

Abre o peito e vai. Com persistência e amor, e sem perder a ternura jamais!

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