terça-feira, 21 de abril de 2015

Resenha de Filme: Chappie



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Em seu terceiro longa-metragem, Neill Bloomkamp segue trilhando o caminho da ficção científica, disposto a levantar a discussão sobre as inteligências humana e artificial, sempre oportuna. Vários foram os autores, no Cinema e na Literatura, só para citar duas artes, a debater o assunto. De Phillip K. Dick a George Orwell, passando por Aldous Huxley e Isaac Asimov, nas letras, e de Ridley Scott a Alex Proyas, passando por Steven Spielberg, não faltam exemplos de diferentes tipos de talento e abordagem para a mesma questão. Infelizmente, Bloomkamp não faz por merecer se integrar a essa galeria bem-sucedida neste novo trabalho, por uma série de problemas que se vão acumulando ao longo da narrativa.

Chappie (idem, 2014) é a história de um robô que estava prestes a ser descartado por não se mostrar mais útil à empresa na qual foi criado. Visivelmente apegado ao autômato, o jovem Deon (Dev Patel) resolve quebrar as regras do local e levá-lo para sua casa, onde vem trabalhando há mais de 900 dias em um projeto de transposição da inteligência humana para uma máquina. A trama se passa em um futuro indefinido, no qual robôs policiais super inteligentes conseguem manter a ordem na cidade. Como são praticamente indestrutíveis, servem muito melhor ao combate ao crime do que seres humanos comuns. Esses robôs são criação de Deon, que amealhou alto prestígio para a empresa em que trabalha, comandada por Michelle Bradley (uma apagada Sigourney Weaver).

Obviamente, a bandidagem não está nem um pouco satisfeita com tais máquinas, e uma gangue cujo líder está com a corda no pescoço porque deve a um outro chefão tem a ideia de sequestrar Deon para reprogramar os robôs e fazê-los atuar a favor do crime. Uma vez no cativeiro, Deon consegue transplantar a inteligência humana para Chappie, que recebe esse nome de Yolandi (Yo-Landi Visser), única mulher do grupo. Trata-se de uma espécie de gíria do inglês sul-africano, que pode ser traduzida como “chapa, companheiro”. Quando começa a funcionar, Chappie (que é dublado por Sharlto Copley, ator-assinatura de Bloomkamp) é como uma criança: desconfiado, medroso e com muito a aprender. Subitamente, Yolandi, que parecia tão casca grossa quanto seus comparsas, é invadida por um instinto materno que se manifesta de forma patética, tornando a personagem bastante incoerente.

Some-se a isso o vilão caricato interpretado por Hugh Jackman. Seu Vincent Moore é mau feito um pica-pau e age exclusivamente movido pela inveja de Deon, que recebeu mais verba para seus projetos por trazer uma boa margem de lucro ao escritório, enquanto Vincent segue confinando a um espaço menor e recebe o descrédito de Michelle quanto a suas propostas. O equívoco do roteiro se estende também à caracterização do personagem, que adota um corte de cabelo muito estranho, que mais parece um resquício do visual de cantores sertanejos da década de 80 brasileira. É um desperdício com Jackman, que já se mostrou ótimo ator, além de exibir carisma por onde passa. Apenas para citar um exemplo recente, ele arrebentou como um dos protagonistas de Os Suspeitos (Prisoners, 2013). Aqui, ele aproveitou seu sotaque australiano na composição do personagem, um indicador de esforço da sua parte e de que o problema maior está mesmo na estrutura do filme.

Chappie coleciona falhas em diferentes níveis, e abusa do conceito de suspensão da descrença, segundo o qual, ao entrar em contato com uma obra, o leitor/espectador deve assumir como real o universo proposto pelo autor. Fica bem difícil exercitar essa suspensão da descrença diante da trama, que caminha para um final cada vez mais estapafúrdio. Até os quinze minutos finais, uma plateia com boa vontade até poderia sorrir aqui e acolá e dar alguns descontos para certas bobagens do roteiro, mas as cenas derradeiras praticamente enterram o filme de vez – naturalmente, não cabe descrevê-las e discuti-las aqui para não estragar a surpresa, que talvez até funcione para alguns. Resta ainda comentar a pouca expressão de Weaver em cena, também por culpa do roteiro que deixa Michelle de lado a maior parte do tempo. Em se tratando de Bloomkamp, Distrito 9 (District 9, 2009) segue como sua pérola, enquanto Elysium (idem, 2013) e este Chappie vêm formando uma curva ascendente em sua carreira de diretor de ficção científica.


Ficha Técnica:
Gênero: Ficção Científica
Direção: Neill Bloomkamp
Roteiro: Teri Tatchell e Neill Bloomkamp
Elenco: Dev Patel, Hugh Jackman, Sigourney Weaver, Sharlto Copley, Jose Pablo Cantillo, Brandon Auret, Johnny Selema, Anderson Cooper, Maurice Carpede, Jason Cope, Kevin Otto, Chris Shields
Produção: Ben Waisbren, Neill Bloomkamp e Simon Kinberg
Fotografia: Trent Opaloch
Montagem: Julian Clarke e Mark Goldblatt
Trilha Sonora: Hans Zimmer
Duração: 120 minutos
Distribuição: Sony
Lançamento (Brasil): 16/04/2015

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